Um dos sentimentos mais imprescindíveis ao ser humano é a fé. Não somente a fé em algo transcendente (que certamente é a mais importante), mas a fé como certeza de que “vale a pena”. De que a vida tem tesouros escondidos. De querer apostar. No entanto, por outro lado, há as trevas. As tempestades que atravessam nossa vida. E o risco maior destes momentos de trevas é o de eles nos aprisionarem. Aprisionarem em sentimentos, situações, medos.
Em algum momento perdi a fé nos relacionamentos amorosos. Não conseguia crer que poderia haver sinceridade ali. Não conseguia ou não queria. Tudo isto por causa de uma fulana. Alguém em quem eu apostei. Pensei que poderia colher algo ali. E pelo que senti foram só espinhos. Não sei por que, ela não gostava de meu "All Star". Um dia me disse que era ridículo... Dizia gostar de mim, mas não respeitava meu "All Star"... De repente a fada transfigurou-se em monstro em minha frente. Acontece que eu acreditava que o amor curava tudo, remediava qualquer coisa. Como dizia São João da Cruz: “ onde não há amor, plante amor e colherá amor”. E isto é verdade. Pode-se colher. No entanto é preciso que a pessoa esteja aberta, pré-disposta. É uma via de mão dupla. Já escrevi neste blog que o amor é gratuito. Se amamos, não podemos exigir ser correspondidos. É claro que se isto ocorre, melhor ainda. Deus nos ama assim. E isto não é masoquismo. O amor humano é imperfeito porque somos imperfeitos. E o erro está em querer encontrar a “pessoa ideal”, pois pessoa ideal não existe. O nome “ideal” já diz tudo: só existe como idealização. O que existe são seres humanos, com suas limitações e imperfeições.
Quanto ao título, “ um par de All Star”, é representativo dessa necessidade de completude que (felizmente ou infelizmente ?) temos nesta vida. (...) “Quem inventou o amor, me explica por favor” (...), já dizia Renato Russo. Pra que serve este amor romântico ? - tão irracional e idealizado. Utópico mesmo. Fantasioso. Não seria muito mais fácil ser racional ? Pra que serve ficar à mercê de sentimentos ? Às vezes fico pensando: “ em determinado momento é que era bom: seu pai escolhia uma mulher pra você, e pronto... Bastava que fosse mais ou menos formosa e boa dona de casa, afinal o que há além disso ? O dia-a-dia não desgasta qualquer relacionamento ? Afinal, hoje temos total liberdade de escolher nosso par e a quantidade de divórcios só aumenta. O excesso de romantismo é um mal, porque idealiza tudo e nos faz intolerantes aos pequenos defeitos. Queremos tudo perfeito.
Lembrei-me agora de uma alegoria: a Cinderela. Nesse conto de fadas, o príncipe busca a “dona do par” do sapato. O sapato era a única coisa que poderia fazer com que ele reconhecesse por quem se encantou. O All Star é tudo de bom. Representa a simplicidade. Claro que hoje os jovens das classes mais abastadas apropriaram-se do All Star. Mas como que se disessem: não somos tão vazios assim. Não nos reduzimos a um tênis de R$ 600,00. Não é isto que nos faz legais.
Sei que há um par de All Star por aí como o meu. E por que justamente “All Star” ? Porque acho o calçado mais despojado que há. Tão simples e ao mesmo tempo moderno. Não chama tanta atenção como os "Nike" e "Pumas" da vida, mas também tem seu charme. Não é "pretensioso". Confortavelmente reveste seu pé. E para que mais serve um calçado? Assim, um par não precisa ser uma beldade. Não precisa ser "poliglota". Nem muito inteligente. Mas uma coisa é fundamental: o despojamento, a capacidade de sorrir da vida, de sorrir para a vida. Sem afetações. Mulher de All Star. Mulher com camisa de futebol. Mulher que gosta de comer porcaria e falar besteira. Chega de beleza superficial. Esta beleza é como uma casca que não resiste às primeiras investidas do tempo. Eu amo a beleza desengonçada, acima do peso, nariz desproporcional. Eu amo a imperfeição. Nossas imperfeições (as inocentes, inofensivas) é que nos tornam únicos. Não me fixo em modelos, padrões. Chega dessas mulheres que tentam segui-los. Que parecem robôs ao seu lado. Quero sorriso, com alface no dente e nariz sujo de mostarda. E de uma moleca. Moleca de “All Star”, sujo e surrado. É disso que o homem que quer sorrir precisa.
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